Feliz Ano Novo aos que tiveram perdas no ano velho e ainda assim recolhem pedras em suas aljavas.
Aos colecionadores de afetos que jamais permitem que suas lagartas se transmutem em borboletas.
Aos cínicos repletos de palavras sem raízes no coração.
Aos colecionadores de afetos que jamais permitem que suas lagartas se transmutem em borboletas.
Aos cínicos repletos de palavras sem raízes no coração.
Feliz Ano Novo às bordadeiras de emoções, que gastam a vida desfiando intrigas e agulhando a boa fama alheia.
Aos céticos desprovidos de horizontes e aos que debruçam sobre a própria solidão para contemplar abismos.
Aos ressuscitadores de desgraças, aos que se escondem em seus sapatos e aos idólatras que cultuam os poderosos.
Aos céticos desprovidos de horizontes e aos que debruçam sobre a própria solidão para contemplar abismos.
Aos ressuscitadores de desgraças, aos que se escondem em seus sapatos e aos idólatras que cultuam os poderosos.
Feliz Ano Novo aos que asfixiam a criança de si e aos que se fantasiam de palhaço para camuflar tristezas.
Aos que gastam a vida contando dinheiro, sempre em débito com o amor.
Aos que acumulam bens e desperdiçam virtudes, ajuntam poder e semeiam mágoas, galgam a fama e pisam em sentimentos.
Feliz Ano Novo aos sonegadores de esperança e aos que crêem apenas nos valores da Bolsa.
Aos mancos de bondade, cegos de utopia, ébrios de ambições e medrosos perante a ousadia de viver.
Aos que têm asas e não sabem voar, são águias que ciscam como galinhas, guardam em si um tigre e miam como gatos.
Aos que têm asas e não sabem voar, são águias que ciscam como galinhas, guardam em si um tigre e miam como gatos.
Feliz Ano Novo aos que se agasalham com gelo e jamais dão ouvidos à sabedoria do fogo.
Aos que alugam a própria dignidade e se revestem da ideologia do consenso.
Aos que escondem montanhas debaixo da cama, congelam estrelas no bolso e torcem o arco-íris até sangrar.
Aos que escondem montanhas debaixo da cama, congelam estrelas no bolso e torcem o arco-íris até sangrar.
Feliz Ano Novo aos que exibem no pedestal de sua mente o próprio corpo, jejuam por razões estéticas e mendigam aos olhos alheios a moeda falsa da admiração convencional.
Aos que ficam inebriados diante da paisagem televisiva e, como Carolina, vêem o mundo passar pela janela.
Aos que proferem palavras furtivas, segredam mentiras, sonham com elefantes de papel e tentam fugir da própria sombra.
Aos que proferem palavras furtivas, segredam mentiras, sonham com elefantes de papel e tentam fugir da própria sombra.
Feliz Ano Novo aos voluntários da servidão, aos que amam amar amores e desamores alheios e nunca experimentam o êxtase de uma paixão inefável.
Aos crentes desprovidos de fé, aos políticos vazios de senso cívico, aos democratas que engraxam botas e dormem ao som de cornetas.
Feliz Ano Novo aos que fazem de seus dias tijolos de catedrais escuras, navegam em pingo d’água e jamais perdem tempo com uma criança.
Aos que cimentam árvores, fazem pontaria em orquídeas e pintam o verde de marrom.
Aos que jamais escutam o silêncio, vociferam palavras sem nexo e tratam seus semelhantes como os motoristas reclamam os buracos na estrada.
Feliz Ano Novo aos que cercam suas almas com arame farpado, abrem com foices seus caminhos na vida e, ainda assim, não sabem que rumo tomar.
Aos que traçam labirintos em seus mapas imaginários, enfeitam a vida com buquês de impropérios e rasgam o ventre da água com os seixos adormecidos noleito de seus rios.
Feliz Ano Novo aos que cavalgam em hipocampos de feltros grávidos de dinamites, multiplicam teorias para subtrair a prática e escondem o horizonte no fundo da gaveta.
Feliz Ano Novo aos que se julgam imortais, incensam a própria imagem e tocam címbalos aos cifrões que servem de prisão aos que estão terminantemente proibidos de tomar em mãos vazias de dinheiro, um prato de comida.
Feliz Ano Novo a todos os infelizes que fazem de suas vidas Lua minguante e se vestem com o escafandro dos seu temores, afogados no sal de um oceano ressecado. Novos lhes sejam o ano e a vida, revertidos e revestidos de ensolaradas esperanças.
(FREI BETTO)